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Barroco

O barroco representa uma época marcada pelas dúvidas existenciais de um homem dividido entre a razão e a penitência religiosa: um período de instabilidade e incertezas.

Exemplo de obra barroca: A Descida da Cruz, Caravaggio (1571-610)*

O Barroco representa um período entre os séculos XVI e XVIII em que o ser humano vivia um conflito entre a racionalidade e a culpa religiosa. Encarado como um movimento cultural e artístico, o Barroco iniciou-se na Itália, ganhando força em toda a Europa e influenciando inclusive as colônias europeias, entre elas o Brasil.

Contexto histórico

Na Europa do século XVI, os limites geográficos do mundo conhecido estavam sendo expandidos. Esse desbravamento imponente fez com que o homem acreditasse que tudo era possível e representou uma revolução comercial imponente: o Mercantilismo, ancorado no metalismo (busca por metais preciosos) e em uma balança de comércio favorável para o acúmulo de riquezas. Procurando dominar a natureza por meio da razão, o homem dedicou-se a novos conhecimentos científicos, retomando a cultura clássica.

Nesse momento vigorava na Europa o Estado Absolutista, um sistema político embasado na centralização do poder nas mãos do rei, considerado um representante divino. A Contrarreforma (movimento da Igreja Católica contra a Reforma Protestante) ganhou força com a unificação da Península Ibérica e buscava não só resgatar os fiéis perdidos para a Reforma Protestante, mas também conquistar novos seguidores.

Como resultado desse contexto, o homem da época era politicamente reprimido, enquanto economicamente era incentivado pelas oportunidades para ascender socialmente.

Características do Barroco

Em decorrência dessa conduta conflitante no período histórico, a Literatura barroca desejava impressionar o leitor, promovendo profunda contemplação sobre a fragilidade humana. Ao entrar em contato com a linguagem desse estilo, é possível observar as seguintes características:

→ A efemeridade do tempo – por meio de textos que representavam a consciência de que a vida na terra era passageira e que deveríamos salvar o espírito. No entanto, alguns autores destacavam que, se a vida era curta, era também essencial aproveitá-la antes que se acabasse – o que era contraditório, uma vez que o ato de aproveitar a vida envolvia o pecado e, onde havia pecado, não poderia haver salvação.

Observe o poema de Gregório de Matos, um dos grandes nomes do Barroco no Brasil, em que o poeta assume o seu pecado porque sabe que esse é o caminho do perdão cristão e mostra-se ciente de que será absolvido, todavia argumenta diretamente com Deus, admitindo que continuará errando, mas que este não desista dele. O poeta culpa-se por gozar a vida, mas tenta salvar-se ainda sim.

A Jesus Cristo Nosso Senhor

Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado,
Da vossa alta clemência me despido;
Porque, quanto mais tenho delinqüido,
Vós tenho a perdoar mais empenhado.
Se basta a vos irar tanto pecado,
A abrandar-vos sobeja um só gemido:
Que a mesma culpa, que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.
Se uma ovelha perdida e já cobrada
Glória tal e prazer tão repentino
Vos deu, como afirmais na Sacra História,
Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada,
Cobrai-a; e não queirais, Pastor Divino,
Perder na vossa ovelha a vossa glória.

→ Cultismo – textos com demasiada preocupação formal, marcados pelo jogo de palavras e pelo excesso de figuras de linguagem. Esse rebuscamento formal é também conhecido como Gongorismo. Observe o poema de Francisco de Vasconcelos (um dos mais importantes poetas barrocos portugueses) que compara espécies de flores e objetos, atribuindo cores e valores, criando combinações e associações inesperadas. Esse soneto ilustra o evento da morte de uma senhora cujo nome iniciava-se com a letra F e reflete sobre a morte como um processo que vai desbotando as coisas belas da vida, como as flores e a aurora, que vão ficando cinza e tristes.

À Morte de F.

Esse Jasmim, que arminhos desacata,
Essa Aurora, que nácares aviva,
Essa Fonte, que aljôfares deriva,
Essa Rosa, que púrpuras desata;

Troca em cinza voraz lustrosa prata,
Brota em pranto cruel púrpura viva,
Profana em turvo pez prata nativa,
Muda em luto infeliz tersa escarlata.

Jasmim na alvura foi, na luz Aurora,
Fonte na graça, Rosa no atributo,
Essa heroica Deidade que em luz repousa.

Porém fora melhor que assim não fora,
Pois a ser cinza, pranto, barro e luto,
Nasceu Jasmim, Aurora, Fonte, Rosa.

→ Conceptismo – textos constituídos pelo encaixe mais lógico de ideias, enigmas, metáforas e analogias. Essa característica é predominante nos textos em prosa e, diferentemente da preocupação formal do cultismo, visa cativar o leitor pelo conteúdo mais lógico. É o caso dos sermões do padre Antônio Vieira, que no trecho a seguir repreende os devotos pecadores comparando-os aos peixes:

Sermão de Santo Antônio (1654):

“Vós, diz Cristo, Senhor nosso, falando com os pregadores, sois o sal da terra: e chama-lhes sal da terra, porque quer que façam na terra o que faz o sal. O efeito do sal é impedir a corrupção; mas quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, havendo tantos nela que têm ofício de sal, qual será, ou qual pode ser a causa desta corrupção? (...) Enfim, que havemos de pregar hoje aos peixes? Nunca pior auditório. Ao menos têm os peixes duas boas qualidades de ouvintes: ouvem e não falam. Uma só cousa pudera desconsolar o Pregador, que é serem gente os peixes que se não há-de converter. Mas esta dor é tão ordinária, que já pelo costume quase se não sente (...) Suposto isto, para que procedamos com clareza, dividirei, peixes, o vosso sermão em dois pontos: no primeiro louvar-vos-ei as vossas atitudes, no segundo repreender-vos-ei os vossos vícios.”(...)

Os principais autores desse período literário no Brasil foram: Frei Vicente de Salvador (1564-1636), Bento Teixeira (1561-1618), Gregório de Matos (1633-1696), Manuel Botelho de Oliveira (1636-1711) e Frei Manuel da Santa Maria de Itaparica (1704-1768).

Manifestações artísticas do barroco

A arte barroca é representada pela agonia e pelo tormento existencial do homem àquela época. São performances que ilustram o contraditório: o sagrado e o profano, a luz e a sombra (técnica conhecida como o chiaroscuro), o pagão e o cristão e o racional e o irracional. Essa vontade de igualar o contexto humano ao divino transformou-se em ostentação. Repare, por exemplo, na opulência de algumas obras arquitetônicas do Vaticano, mais especificamente no estilo retorcido das colunas negras do altar na Basílica de São Pedro, que, segundo as características da arte barroca, desejava impressionar e influenciar o receptor para que ele elevasse a sua fé por meio dos sentimentos e da emoção, apesar de seu raciocínio como homem. Caravaggio, Rubens, Rembrandt e Velázquez são mestres da pintura que ficaram conhecidos por esse estilo.


Arquitetura do altar da Basílica de São Pedro – Vaticano, Roma**
 

Resumo:

As características gerais do período são:

Conflito entre a razão e a religião

Contexto histórico: Absolutismo e Contrarreforma

Arte exagerada e requintada

Oposição, Cultismo e Conceptismo na Literatura


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Créditos:
Renata Sedmakova e Shuterstock
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*Créditos: photogolfer e Shutterstock

 


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Por Katyucha de Oliveira

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